sexta-feira, 30 de janeiro de 2009

Marcos Ribas de Faria: Tudo começa com um pronome…

Parece simples? E é. Ainda que talvez não pelo modo como se costume ler. O “ele” que abre o título (“Ele precisa começar" ) não é tão simples assim. Ou óbvio. Aliás, óbvio é um adjetivo ou uma qualificação que passa ao largo do espetáculo do Felipe.

O “ele” é também “eu”, Isto é, o “ele”personagem é o “eu” ator e diretor. E vice-versa. Se “ele”, o personagem precisa começar a escrever (ou a criar) uma peça, o “eu” igualmente precisa começar a criar (ou a escrever) um espetáculo. Assim, os dados mallarmaicos do jogo de dados são ofertados.

Afinal, neste jogo (nos sentidos franceses do “jeu” – jogo e representação), a peça em processo de escrita é exatamente o espetáculo em processo de construção à vista do público. E vice-versa. O prazer do jogo (e da representação) é duplo. Na verdade, mais. É múltiplo.

Ele o é, evidentemente, do Felipe que é autor, ator, diretor, desenhista da trilha sonora, operador de luz etc. Já aí se encontra a citada multiplidade. Porém, há mais. Na invenção prazerosa da trama (escrita e representada, tornando ludicamente um só os espaços possíveis e reconhecíveis, algo altamente estimulante, uma soma carinhosa e apaixonada), o público torna-se igualmente autor, diretor etc.

Daí, o “eu” que é “ele”, vira também “nós” e “eles”. Para, assim, fechar em “todos”. Ou, instigantemente, abrir para todos. O folhetim narrado, as indagações propostas, o desenho cênico apresentado, as dúvidas expressas ou insinuadas, erigem-se em uma obra aberta onde o prazer da invenção, permeado com os necessários humor e carinho (assim como apresentado com a devida paixão pelo ato teatral), surge godardianamente como um aposta irresistível.

Ele (assim como o eu, o eles, o nós, o todos) é o artífice deste processo no qual a criação é refletida. Afinal, a brincadeira (o “jeu”) que remete a improvisações à Ornette Coleman, ao olhar de Godard sobre o musical (“Uma Mulher é uma Mulher”), é uma peça que não é uma peça que é uma peça que é não é um espetáculo que é um espetáculo que é uma peça…

E como, neste caso, o teatro precisa começar para continuar, todos os dias o desafio elegante e inteligente é proposto e recomeçado para poder ser continuado e assim existir. Igual e diferentemente. Nos caminhos a que todos nós somos levados a passear, bifurcados como os jardins borgeanos, ou não, isso é fundamental. E assim é construído para ser desconstruído para ser construído…por assim fora.

De uma certa forma, é um casamento fascinante, até porque não se assume pretensioso e jamais como resposta (e sim como pergunta), onde se pode ler/ver/ouvir Godard, Mallarmé, aventuras cinematográficas (holly ou bollywodianas) e Coleman, como já dito, mas igualmente, dentro de uma liberdade e de uma descontração alicerçadas em um rigor jamais estéril (e sim provocador), Hitchcock, Caetano, comédias românticas, melodramas, John Cage e improvisos schubertianos…

Felipe começa e continua, sem fechar. Todos começam e continuam sem fechar. Na liberdade da imaginação (e da invenção), o ato teatral acontece. Felizmente. Onde está o “precisa”? Em todos nós. No teatro. Na arte. Na criação.

Por MARCOS RIBAS DE FARIA

Um comentário:

Bruno Perillo disse...

Ola Marcos, tudo bem?

Meu nome é Bruno Perillo, sou ator e diretor. Gostaria de falar com vc, vc teria um email para eu te mandar uma mensagem?
Muito obrigado