
Explicando: fala-se aqui de peças em que a base da comunicação teatral – o texto – muitas vezes nem sequer existe de antemão, sendo encontrado e moldado a partir de vivências, pesquisas, experimentos e ensaios. Ou, em outros casos, todo o repertório dos intérpretes e suas maneiras práticas de abordagem de um tema ou história é que enriquecem e transformam um texto que de fato existe (às vezes em forma não-dramática - por exemplo, um conto) como ponto de partida.
Os exemplos são muitos e caminham de mãos dadas com uma já desgastadamente apontada realidade da cena dessa década, que é o “teatro de grupo”. Entre tantos outros, Cia. Livre, Grupo XIX de Teatro, Cia. Luna Lunera e Grupo Espanca! demonstraram sucesso nessa seara. Com resultados frescos e surpreendentes (“Por Elise”), densos e reveladores (“Arena Conta Danton”), intensos, inventivos e delicados (“Aqueles Dois”, “Hysteria”, “Arrufos”) ou simplesmente sublimes (“Negrinha”).
E quando, afastado do grupo, um ator coloca-se sozinho nessa jornada de erguer um espetáculo, sem um autor que o apóie? Ou, antes, quando o autor é ele mesmo, antes ou durante a composição da cena?
É nessa experiência que Felipe Rocha se atira em Ele Precisa Começar.
Para todos os efeitos, o experimento de Felipe dá certo porque ele é ator de uma profunda simpatia, no sentido mais amplo do termo. Suas idéias podem parecer – porque em certa medida são mesmo – dispersas e digressivas, pedaços flutuantes em busca de um todo. Mas o eixo central de sua performance é a sua própria presença e sua capacidade sempre precisa em provocar a busca por imagens ativas e poéticas extraídas de suas palavras. Ele pode não estar dizendo um texto com progressão dramática ou relações causais claras, mas os elementos que traz para a troca estética e emotiva estão sempre vivos, sempre instigando atmosferas e sensações, sempre causando algo, seja o riso (na maior parte das vezes), o incômodo ou a sentimentalidade.
Ele Precisa Começar começa com a falsa idéia de um experimento cênico de câmara e agiganta seus espaços (físicos e semânticos) com uma sacolejante explosividade. É como um elefante numa loja de porcelanas – exceto que o elefante canta e dança balé entre as louças, sem jamais derrubá-las.
(Isso sem contar que a cena em que o ator protagoniza um memorável embate com o revisor ortográfico de seu computador é desde já para não se esquecer.)
Por RAFAEL GOMES em 17/3/09
www.rafaelgomes.blogspot.com
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